terça-feira, 8 de novembro de 2011

RG CRÍTICA #08: E O AMOR SUPEROU A REVOLUÇÃO NO SBT

Tiago Santiago bem que tenta trazer uma trama inovadora para as novelas brasileiras, mas o folhetim acabou se tornando “mais um na multidão”.

Logo da novela
   No ar desde o dia 5 de abril de 2011, e com previsão de 180 capítulos, “Amor e Revolução” ocupa a faixa noturna de novelas do SBT, antes ocupada pela reprise da trama da extinta Rede Manchete: “A História de Ana Raio e Zé Trovão”. O folhetim é escrito por Tiago Santiago – que já trabalhou na Rede Globo como colaborador de várias novelas, mas na Rede Record foi responsável por novelas como “A Escrava Isaura” (a adaptação de 2004 [sua obra-prima, em minha opinião]), “Prova de Amor” (2005) e a chamada “trilogia dos mutantes” (“Caminhos do Coração”, “Os Mutantes – Caminhos do Coração” e “Os Mutantes – Promessas de Amor”) entre 2007 e 2009, quando deixou a emissora da Barra Funda e assinou com a “TV mais feliz do Brasil”. Na emissora da Anhanguera, Tiago já escreveu a adaptação de “Uma Rosa Com Amor” (2010), sendo “Amor e Revolução” sua segunda novela na casa.
   A trama narra uma história de amor entre José Guerra (Cláudio Lins), filho de um militar, e Maria Paixão (Graziella Schmitt), líder de um movimento estudantil que combate com forças armadas a ditadura militar no Brasil. E é nesse pano de fundo histórico que Tiago Santiago encontra seu "trunfo". Pois até então, nenhuma emissora havia se empenhado em escrever uma obra sobre esse momento tão turbulento do nosso país. Tiago Santiago deixou claro à imprensa, antes da novela estrear, que a ditadura militar era o "eixo" principal da trama, mostrando a revolução que aconteceu no país entre os anos 60 até o final dos anos 80, envolvendo a moda, a música, a chegada da televisão na vida da família brasileira e vários outros aspectos que mudaram ao longo desses anos. Era um convite irrecusável acompanhar o desenrolar desta trama.

José Guerra e Maria Paixão: Romeu e Julieta no meio da ditadura

   Dia desses, resolvi acompanhar o capítulo 152, exibido no último dia 02 de Novembro, e ver a quantas andava a novela. Mesmo sabendo que um capítulo só é pouco para tecer uma crítica consistente sobre todo o folhetim, é suficiente para dizer se valeria a pena, por exemplo, para pessoas que não viram a novela do início (como eu), acompanhar seus últimos 30 capítulos. Então, eis o meu singelo veredicto:
   A primeira coisa que chama atenção num capítulo de “Amor e Revolução” é o documento fictício de “autorização” de veiculação da novela, nos mesmos moldes da época da ditadura. É uma sacada interessante do Tiago Santiago. Mas o que parece ser sério, se torna um tanto quanto hilário quando se ouve uma voz em off dizer: “Agora, mais um campeão de audiência. (...)” Bem, se o SBT considera picos de 7 pontos um programa campeão de audiência, quem sou eu pra discutir né? #vaientender

A autorização de veiculação da novela foi bem sacada pelo Tiago Santiago.

   O capítulo 152 começou com uma roda de revolucionários numa reunião informal para discutir se executavam ou não o Major Filinto (Nico Puig, que por sinal, convence muito no papel), que eles haviam acabado de sequestrar, numa ação deles dentro de um hospital. Senti um #PérolaNegraFeelings quando vi Olívia, interpretada por Patrícia de Sabrit, revelar que não se chamava Violeta (a “irmã gêmea” da Olívia), pois tudo era uma armação dela para encurralar seu ex-esposo, o próprio Filinto, após ele tentar matá-la tempos atrás. Nesse interrogatório, os revolucionários citam todos os crimes de tortura feitos pelo Filinto (provavelmente muitos, se contarmos que já passou mais de 150 capítulos), e todos discutem que destino dar a ele. O tema pena de morte é discutido de forma indireta. Nos núcleos secundários, vemos uma cena tragicômica do casal Marcela (Luciana Vendramini) e Marina (Gisele Tigre) – que pararam o Brasil com o primeiro beijo lésbico das telenovelas brasileiras, em maio deste ano – onde durante a comemoração do aniversário de Marcela num restaurante junto com os seus pais e Marina, quer contar pra eles sobre quem ela é de verdade. A brincadeira de “conta-não-conta” fica engraçada por diversas intervenções, tanto de Marina quanto dos seus pais. Outro momento leve da trama fica por conta do casal Bete (Natália Vidal) e João (Paulo Leal), onde estão tentando se acertar.

Luciana Vendramini e Gisele Tigre no beijo lésbico que parou o Brasil.

   Além de tortura (palavra que se ouve [atualmente, apenas ouve, explicarei o porque mais adiante] muitas vezes durante a novela), vi uma cena onde Miriam (Thaís Pacholek), sugere um aborto a João Guerra, já que está grávida dele e ele não a aceita (ou seja, não a ama). Uma atuação brilhante da Pacholek, se não fosse pela frase da Miriam, um tanto piegas, após se descontrolar, quebrar um vaso e João a repreender: “É melhor quebrar um vaso do que explodir o meu coração”. Romântico e dramático demais pra uma situação de raiva.
   Voltando na questão ditadura, faço um destaque à cena do carcereiro Jeová (Lui Mendes) ao prisioneiro Ivo no Dops (o principal órgão da ditadura brasileira, onde se encarceram e torturam os “inimigos do estado”). Jeová, que não concorda com a tortura e em muitas atitudes do Dops, acolhe e puxa assunto com o prisioneiro sobre o revolucionário Carlos Marighella e, ao lindo som instrumental de “Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores”, de Geraldo Vandré, Ivo recita um poema de Marighella (“Liberdade”) e fala de outras célebres personagens de nossa história que buscavam um mundo mais tranquilo naquela época.
   E falando na trilha sonora da novela, que é muito boa, que conta com artistas como Milton Nascimento, Caetano Veloso e Chico Buarque, tem destaque na abertura a música “Roda Viva”, interpretado pelo conjunto MPB-4. A abertura, muito bem feita, faz menção a todo o contexto da ditadura, mostrando indiretamente a história da novela. Outro ponto positivo na trama é a fidedignidade da equipe nos cenários e figurinos, que foram muito bem construídos.
   Porém, um ponto que chama atenção na abertura e que merece uma colocação são as várias menções à palavra “revolução”. Tiago Santiago queria com essa novela levar essa palavra até às últimas consequências. Tanto que no começo da trama, as cenas excessivas de tortura chegavam a chocar as pessoas devido a excelente qualidade das cenas, de tão real que parecia. Logo no começo também, os capítulos se encerravam com depoimentos de pessoas que lutaram na época da ditadura (no maior estilo “Páginas da Vida”, da Globo). Depoimentos valiosos de José Dirceu, Luis Ayrão, Luis Carlos Prestes Filho, entre tantos outros, foram exibidos até o mês de julho, quando o SBT resolveu cancelar esses momentos. Segundo a assessoria da emissora na época, eles tiraram os depoimentos porque não conseguia nenhum militar ou ex-militar para falar sobre o assunto. A rede vinha exibindo desde então apenas depoimentos de pessoas da oposição na época, o que, na opinião da direção da emissora, não era correto nem justo. E para não ficar só com um lado da história, os depoimentos foram banidos. Uma pena para nós, brasileiros, pois esses depoimentos eram muito melhores que certas aulas de história. Uma ideia genial que se perdeu de vista.

As torturas em "Amor e Revolução" eram bem feitas, mas foram banidas pelo "patrão".

   As cenas de tortura, os depoimentos, o tão falado beijo gay, e a audiência baixa fez acender o alarme do patrão Silvio Santos, onde em reunião com o Tiago ele foi categórico: pediu pra tirar o que tem de forte na novela e elevar o nível de humor e amor da trama, deixando a novela “mais leve”. Ou seja: a “revolução” tinha que ser menos citada e abordar mais o “amor”. E pronto: a originalidade da novela foi por água abaixo... Uma pena [2]!
   Em virtude de tudo o que “Amor e Revolução” passou nesses pouco mais de 150 capítulos, o que eu vi no último dia 2 é uma trama, ainda sim, coesa, e tenta fazer um bom trabalho sobre contar a história da ditadura. Mas a simplicidade atual da novela, com poucas cenas de impacto social, faz com que esse folhetim se torne igual aos demais. Ou seja: mais do mesmo, como as novelas “Senhora do Destino” (Globo) e “Cidadão Brasileiro” (Record) que apenas pincelaram trechos da ditadura em suas histórias.
   Bem, falta eu responder se vale a pena acompanhar o desfecho de “Amor e Revolução”, né? Então, a minha resposta é sim. Pois mesmo que a trama tenha perdido seu trunfo, sua originalidade, a novela é bem feita tecnicamente, tem um elenco capaz e entregue a trama. Ainda é possível nos localizarmos na época da ditadura assistindo à novela, e essa viagem merece ver até onde ela vai nos levar. #RGRecomenda

Um comentário:

  1. Gosto da novela pela proposta ousada, que logo caiu por terra quando vimos a qualidade do elenco e da própria narrativa, que deveria ser dinâmica, até pelo tema, mas terminou sendo arrastado e, mais tarde, amenizado para ter míseros seis pontos de ibope. Hoje nem acompanho: acho que a única coisa que se salva é a parte técnica - figurinos e caracterização, luz, cenários. O elenco pode até ser fraco, mas uma direção ruim e o péssimo texto apresentado fizeram com que pessoas críticas, que essas sim se interessaram em ver Amor e Revolução, deixassem ela de lado para ver outros canais ou até desligar a TV. Que pena. Seria um bom projeto..

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